domingo, 16 de fevereiro de 2014

O melhor amigo


A lâmina do machado decepou o braço esquerdo de um só golpe, o engasgo de horror o despertou do pesadelo. Acordou com o membro dormente pelo peso do corpo em mais uma péssima noite de desmaio alcoólico. Sentiu a ânsia de vômito entremeada de calafrios apesar do abafado meio-dia do verão tropical. Abriu a velha geladeira vazia na triste ilusão de encontrar uma cerveja. Bebeu água da pia e teve de correr ao fétido banheiro para não vomitar no corredor. Depois olhou o rosto envelhecido no espelho rachado e viu os músculos da face tremer ininterruptamente como a executar uma muda sinfonia de tiques nervosos. Voltou à cozinha e com a alma no escuro pensou na luz debaixo da pia, o brilho estava exatamente entre a água sanitária e o desinfetante; Pereirinha, álcool 90 graus, mais que depressa agarrou a velha e vazia leiteira metálica e despejou metade da garrafa completando com um pouco de água, em seguida segurando com as duas mãos minimizou a labiríntica tremedeira com um imenso gole. A terrível sensação de envenenamento fez com que, como um cospe fogo, regurgitasse violentamente até expelir o esverdeado líquido que sabia ser a bílis. O segundo gole desceu queimando, mas não voltou igual ao primeiro e como um passe de mágica consumiu com o tremor, os tiques e o mal estar. Fez a barba na firmeza das mãos e antes de sair mirou com gratidão para debaixo da pia deixando escapar um; "fique quietinho aí", como se falasse a um cachorro engarrafado.

Simch

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