Pompons coloridos ao vento do ar-condicionado, um homem vestido de mosquito simula tocar uma guitarra de esponja, adolescentes coxudas dançam em volta de uma gringa fantasiada de cacique western que convida as crianças a brincarem de índio enquanto é observada por nativos perplexos, tapando suas vergonhas sob calções da Umbro.
Xuxa, Mara Maravilha e outras manequins eram a porta-vozes da febre indianista que dominou os anos oitenta. Sem poesia, métrica ou nacionalismo, mas recheado de mensagens idílicas; o resgate do índio era mais um artificio para colorir o mundo de chocolate dos programas infantis em pérolas como índio ficou sozinho/índio querer carinho/índio querer de volta a sua paz ou Tuiuiu iu iu/ Sou curumim iê iê/ Tuiuiu iu iu/ Sou curumã arauê.
Bem aventurados os que estudavam à tarde. A eles que o idílico mundo das botas brancas se desvelava sem corruptelas: naves espaciais com efeito néon, desjejum de rainha, mascotes com nomes de doença epidêmica, lições de bom mocismo para as crianças de apartamento e lolitas de shorts em rituais satânicos subliminares.
Faz de mim estrela, que eu já sei brilhar!
Nesse espetáculo iluminado por sóis de espuma e tinta guache, aprendíamos a suprimir as frustrações repetindo o mantra "sonhar é poder" entoado logo no café da manhã ao mastigarmos o pão velho com manteiga e sem mordomo pra nos servir; a procurar compensações pois quem não tinha genes germânicos dominantes para ser paquita podia preconizar a puberdade com os dorsos nus e sem pêlos dos paquitos e a vislumbrar príncipes encantados em espécimes improváveis como o desastrado entregador de pizza encorajado por uma skatista de doze anos de Lua de Cristal.

Sonho encantado onde está você?
No universo das apresentadoras infatilóides, as letras da dupla foram revestidas com clichês de auto-ajuda (Lua de Cristal), reverência à "rainha" (I Love you, Xuxu), otimismo inebriante (Arco Íris) e mensagens baratas de conscientização somadas ao canto claudicante de Xuxa. Mesmo assim, os mestres Sullivan e Massadas mantinham a excelência lançando mão de solos de guitarra e linhas de teclados lisérgicas, colocando um sabor agridoce neste reino hiperglicêmico.
Com explosões matinais de alegria, o mundo das botas brancas desfraldava a bandeira da realização implacável dos sonhos sem a hipótese de que o algodão-doce poderia virar fumaça. Xuxa é o ícone de uma geração que encara a felicidade como um direito inalienável, onde o sofrimento é um erro ou sinal de doença e as intempéries podem destruir a noção de felicidade.
1. Certo ou Errado - Patrícia Marx
2. Festa do Amor - Patrícia Marx
3. Sonho de Amor - Patrícia Marx
4. É de Chocolate - Trem da Alegria
5. He-man - Trem da Alegria
6. Iô-iô - Trem da Alegria
7. Pique-pega escone - Trem da Alegria
8. Pra ver se cola - Trem da Alegria
9. Thundercats - Trem da Alegria
10. Tic tac do amor - Trem da Alegria
11. Uni duni tê - Trem da Alegria
12. Arco íris - Xuxa
13. Brincar de índio - Xuxa
14. I love you Xuxu - Xuxa
15. Lua de Cristal - Xuxa
16. Parabéns da Xuxa - Xuxa
Texto da colaboradora Débora Paixão
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